
As doenças reumáticas são um grupo heterogêneo de condições que afetam articulações, músculos, tecidos conjuntivos e órgãos, podendo causar dor e inflamação. Uma complicação muitas vezes subestimada dessas doenças é a uveíte, uma inflamação da úvea, a camada média do olho. A uveíte pode levar a complicações significativas, incluindo perda de visão, e está frequentemente associada a várias doenças reumáticas. Este artigo explora as principais doenças reumáticas que podem causar uveíte, suas características, mecanismos de ação e como a gestão dessas condições é essencial para a saúde ocular.
O Que é Uveite?
A uveíte refere-se à inflamação da úvea, que consiste em três partes: íris, corpo ciliar e coroide, e estruturas associadas, como a retina e o nervo óptico Os sintomas típicos incluem dor ocular, vermelhidão, sensibilidade à luz, visão turva e, em casos graves, perda de visão. A uveíte pode ser classificada em anterior, intermediária e posterior, dependendo da parte do olho afetada. O tratamento geralmente envolve o uso de corticosteroides e imunossupressores, especialmente quando associada a doenças reumáticas.
DOENÇAS REUMÁTICAS ASSOCIADAS À UVEÍTE
Artrite Reumatoide (AR)
A artrite reumatoide é uma doença autoimune crônica caracterizada pela inflamação das articulações. Estudos mostram que a uveÍte é uma complicação comum em pacientes com AR, ocorrendo em até 10% dos casos. A inflamação ocular pode ser causada pela ativação do sistema imunológico, que ataca não apenas as articulações, mas também os tecidos oculares. Outra alteração oftalmológica comum em pessoas com artrite reumatoide é a esclerite, a inflamação do “branco do olho”.
Espondilite Anquilosante (EA)

A espondilite anquilosante é uma forma de artrite que afeta principalmente a coluna vertebral e as articulações sacroilíacas. Aproximadamente 30% dos pacientes com EA desenvolvem uveíte anterior, que pode ocorrer de forma aguda e recorrente e costuma sem bastante intensa, com muita dor, vermelhidão e fotofobia. A uveíte da EA está frequentemente associada à presença do antígeno HLA-B27, um marcador genético que predisõe os indivíduos a desenvolver a doença.
Artrite Idiopática Juvenil (AIJ)

A artrite idiopática juvenil é uma das causas mais comuns de artrite em crianças e pode resultar em uveíte em até 20% dos casos. A uveíte associada à AIJ geralmente é assintomática, ou seja, a criança não sente nada, o que torna o monitoramento regular da saúde ocular fundamental, com consultas regulares no oftalmologista, mesmo que a criança não reclame de sintomas visuais. O tratamento da AIJ deve ser coordenado com oftalmologistas para prevenir complicações visuais.
Lupus Eritematoso Sistêmico (LES)
O lupus eritematoso sistêmico é uma doença autoimune que pode afetar múltiplos sistemas do corpo, incluindo a pele, articulações e órgãos internos. A uveíte pode ocorrer em pacientes com LES, embora seja menos comum do que em outras doenças reumáticas. Entretanto, pode causar formas graves de uveíte, como a vasculite retiniana. A inflamação ocular é frequentemente um sinal de atividade da doença e requer atenção imediata.
Síndrome de Sjögren
A síndrome de Sjögren é uma doença autoimune que afeta as glândulas exócrinas, resultando em ressecamento ocular e bucal. Embora a uveíte não seja uma característica primária da síndrome de Sjögren, a inflamação ocular pode ocorrer devido à autoimunidade. Pessoas com esta síndrome devem realizar acompanhamento oftalmológico regular, muitas vezes com utilização de colírios lubrificantes, como as lágrimas artificais.
Artrite Psoriásica

A artrite psoriásica é uma condição inflamatória que afeta algumas pessoas com psoríase, uma doença de pele autoimune. A uveite é uma manifestação menos comum, mas ainda relevante, em pacientes com artrite psoriásica. A inflamação ocular pode ser tratada com os mesmos medicamentos utilizados para gerenciar a artrite.
Mecanismos de Desenvolvimento da Uveite
A relação entre doenças reumáticas e uveíte pode ser explicada por vários mecanismos. As doenças autoimunes podem levar a uma ativação excessiva do sistema imunológico, resultando em inflamação não apenas nas articulações, mas também em tecidos oculares. Além disso, a presença de certos marcadores genéticos, como o HLA-B27, pode aumentar a predisposição para o desenvolvimento de uveite em indivíduos com doenças reumáticas.
Diagnóstico da Uveíte

O diagnóstico da uveite em pacientes com doenças reumáticas requer uma abordagem multidisciplinar. Oftalmologistas realizam exames oftalmológicos detalhados, incluindo a avaliação da acuidade visual, exame de fundoscopia e testes de pressão intraocular. Além disso, exames de imagem como a tomografia de coerência óptica (OCT) podem ser utilizados para avaliar a estrutura interna do olho. É essencial também que os médicos reumatologistas estejam envolvidos, pois eles podem realizar testes laboratoriais para identificar marcadores autoimunes e a atividade da doença reumática subjacente.
Tratamento da Uveíte

O tratamento da uveíte frequentemente envolve o uso de corticosteroides para reduzir a inflamação. Esses medicamentos podem ser administrados topicamente (em colírios), sistemicamente (por via oral ou injetável) ou por injeção intravítrea, dependendo da gravidade da condição. Em casos em que a uveíte está associada a doenças autoimunes, os imunossupressores, como metotrexato, azatioprina ou biológicos, como o adalimumabe, podem ser necessários para controlar a doença subjacente e prevenir recorrências.
Manejo das Doenças Reumáticas
O manejo eficaz das doenças reumáticas é crucial para o controle da uveíte. Isso geralmente envolve uma combinação de medicamentos anti-inflamatórios não esteroides (AINEs), corticosteroides e agentes imunossupressores, dependendo da doença específica e da gravidade da inflamação ocular. O acompanhamento regular com um reumatologista é fundamental para monitorar a atividade da doença e ajustar o tratamento conforme necessário.
Importância do Monitoramento Regular
O monitoramento regular é essencial para pacientes com doenças reumáticas que têm risco de desenvolver uveíte. Consultas oftalmológicas periódicas podem ajudar na detecção precoce de sinais de inflamação ocular, permitindo intervenções rápidas e eficazes. Além disso, o autoexame para sintomas como dor ocular, fotofobia e alterações na visão deve ser incentivado, especialmente para aqueles com histórico de uveíte.
Impacto na Qualidade de Vida
A uveíte pode ter um impacto significativo na qualidade de vida dos pacientes. Sintomas como dor ocular e visão turva podem afetar a capacidade de realizar atividades diárias, trabalho e interação social. Além disso, a preocupação com a perda de visão pode levar a distúrbios emocionais, como ansiedade e depressão. Portanto, um suporte psicológico pode ser benéfico para esses pacientes, ajudando-os a lidar com as implicações emocionais e sociais da condição.
Conclusão
As doenças reumáticas têm uma relação complexa com a uveíte, e a compreensão dessa conexão é vital para a gestão eficaz de ambas as condições. O reconhecimento precoce da uveíte e o tratamento adequado são essenciais para evitar complicações visuais graves. Pacientes com doenças reumáticas devem ser monitorados de perto por uma equipe multidisciplinar de profissionais de saúde, incluindo reumatologistas e oftalmologistas, para garantir um manejo eficaz e uma melhor qualidade de vida.
A pesquisa sobre a conexão entre doenças reumáticas e uveite continua a evoluir, e novas terapias estão sendo desenvolvidas para melhorar o tratamento e o manejo dessas condições. A conscientização sobre a possibilidade de uveite em pacientes com doenças reumáticas é fundamental para promover a saúde ocular e geral. Os pacientes devem ser encorajados a se educar sobre suas doenças e a manter um diálogo aberto com seus profissionais de saúde, garantindo que recebam o cuidado adequado e a atenção que merecem.